quarta-feira, 25 de abril de 2007

Manifesto


Da liberdade como uma ilusão. Da liberdade como um sonho. Da liberdade como uma promessa. Do amanhã como uma linha suspensa entre nós e o horizonte. Das palavras desarmadas. E das armas do coração. E quando tudo são brumas para além do segundo presente, vem a chacota, o sarcasmo e as lendas sobre uma praia de onde nunca se partiu mas de onde se diz que a vista não traz bom augúrio.



E porque o silêncio é a mais provocadora das tentações, somos obrigados a falar. Para que os momentos não morram nem se percam e a memória não se torne demasiado curta para os nossos passos. A revolução começa todos os dias na manhã dos nossos gestos, na antecâmara dos nossos pensamentos. Os ventos da Primavera trouxeram-nos primeiro o luar, os sinos de uma nova vida e a marcha de um povo desperto. Mas Abril pode sempre ressurgir nas ruínas de cada minuto gasto.



Um dia a revolução será de novo uma dádiva gratuita de cada um para todos e a chuva trará uma nova vaga de pétalas vermelhas. Entretanto, ainda nos falam por metáforas, e o mundo ainda nos vigia a cada ideia e a cada palavra. Porém, não desistimos de ceder às tentações daquela voz interior que nos ensina a dizer não.



Ser livre é também saber dizer não, de tal modo que se diga sim a quem somos de facto. Cada um de nós e a Humanidade em conjunto. Quem se esquece de onde veio e onde está nunca se reencontrará à frente, na estação seguinte da viagem.



Era impossível continuarmos calados. Mesmo já no final do dia, prestes a regressar à loucura com que o mundo se delicia na sua inércia cheia de lucidez.



Viva Abril.

terça-feira, 17 de abril de 2007

Outro


deixa-me encontrar-te
deixa-nos ser encontrados


a voz do mar não é a tua, meu amor
parece-me que a ouvi longe do teu corpo
tu eras tu como sempre e em cada retorno
eu não era e no momento fui a miragem
o somatório foi uma mútua ausência
enquanto as marés nos falavam
de tantas partidas


de parede em espelho em parede
vences-me à luz do dia


invades-me
as palavras são a noite dos teus beijos


e no teu olhar julguei descobrir o mundo
vi num copo de cristal a nossa sorte
o brinde não foi a nossa matéria ao longo do cetim


ouvia-se outra voz quando me falavas de amor